quinta-feira, 1 de maio de 2014

UTOPIA CRISTÃ de JUSTIÇA SOCIAL: José Herculano Pires - O Reino - CAPÍTULO 3: OS FRUTOS DA TERRA

CAPÍTULO 3
OS FRUTOS DA TERRA
 A Terra dá frutos. Há frutos silvestres e frutos cultivados pelo homem. Os frutos da Terra alimentam os filhos de Deus. Mas há homens que usam os frutos da Terra para enriquecer. É justo que haja riqueza na Terra e que os frutos da terra enriqueçam os homens. Deus não quer a pobreza, mas a riqueza.

Olhai para o Céu e vereis o tesouro de Deus semeado no Infinito. Olhai para as entranhas da Terra e vereis estrelas ocultas. Também elas são frutos da terra. Frutos que os homens extraem, colhendo-os nos misteriosos ramos de árvores subterrâneas. Esses frutos também produzem riquezas pessoais.

Deus quer que a riqueza se espalhe no Mundo. A riqueza é a herança de Deus e o apóstolo Paulo ensinou:
- somos herdeiros de deus e co-herdeiros de Cristo.

- Ai daquele que pretender empobrecer os homens e empobrecer a Terra. Este pequeno Mundo não foi lançado na rota dos Mundos para se tornar miserável, um mendigo do Espaço. Seu destino é a grandeza Universal, a glória do Infinito, a riqueza inumerável do Céu. Deus lhe concedeu um Sol de ouro e uma Lua de prata. E rodeou-o de uma rede cintilante de Estrelas. As torres do Reino apontam para esses tesouros, que são a herança dos homens.

O mensageiro do Reino me disse um dia:

- pensais que Deus é Deus de pobres e esfarrapados? Assim como as escrituras nos dizem que Ele não é Deus de mortos, mas de vivos, também nos mostram que ele é Deus de ricos e não de mendigos. Os mundos mais próximos de Deus são de maravilhosa riqueza, transbordantes de cintilações. Não vistes a descrição de Jerusalém Celeste no apocalipse? O Reino é rico, mas a riqueza do Reino é abundante e impessoal. O que faz a pobreza é a riqueza pessoal. Há um caruncho da alma: o egoísmo. Esse caruncho destrói a maior riqueza do Universo, que é o espírito, quando o homem se julga dono pessoal dos frutos da terra.

Lembrei-me do canto de Maria, que foi o prelúdio da proclamação de Nazaré. A suave Mãe do Jovem Carpinteiro exclama, referindo-se ao Senhor: - depôs do Trono os poderosos e elevou os humildes; encheu de bens os que tinham fome e despediu vazios os que eram ricos.

Não é a riqueza que é condenada, pois o Senhor a tira de uns para dá-la a outros, segundo a Justiça. E, segundo o Amor, remete à pobreza aqueles que devem conhecê-la melhor, para não se julgarem os privilegiados da Terra. Que são os bens, se não os frutos da Terra? Maria previu, na sua intuição humana de Mãe e na sua previsão Divina de espírito, a redistribuição dos frutos da Terra para que o Amor e a Justiça do Reino triunfem entre os homens.

A árvore que lança suas raízes ao solo e estende seus ramos aos ventos não dá frutos para este ou aquele, mas para todos. Vede uma árvore em estado de pureza, em estado natural, na mata ou no campo. Ela se enfeita de flores e se cobre de frutos para as aves, os animais e os homens, se os houver. Se os homens não a conhecerem, pouco importa. Porque os frutos da Terra não são dados apenas aos homens. Também os ventos se alimentam de pólens e folhas, arrancam os frutos maduros dos ramos e os semeiam na distância, para que os bichos aproveitem a sua polpa e o solo absorva as sementes, fazendo-as germinar. Que direito tem um homem de cercar uma árvore ou mais árvores, de torna-las suas escravas particulares, de arrebatar-lhes sistematicamente os frutos para transformá-los em riqueza pessoal? Os frutos devem saciar a fome dos famintos, alimentar as crianças e fortalecê-las para o futuro.

A riqueza dos frutos é para todos. A árvore é o gesto de Deus ensinando aos homens a eterna doação. Nada lhe pedem e ela tudo dá. Podia enrolar os frutos em cipós e escondê-los para si mesma, devorá-los em silêncio ou deixá-los morrer sem proveito entre as suas garras. Mas ela estende os ramos no Céu e a sombra na Terra. Distribui perfume e pólen aos ventos e oferece os seus frutos sem pedir recompensa. O Reino é cercado de árvores, de vastos arvoredos com flores e frutos, de pomares e jardins abertos para que todos possam desfrutá-los. Os filhos do Reino não estão sujeitos aos monopolizadores dos frutos.

O Jovem Carpinteiro ensinou um dia:

- o campo de um homem rico havia dado abundantes frutos e ele revolvia dentro de si estes pensamentos, dizendo: - que farei, pois não tenho onde recolher os meus frutos? - e disse: - farei isto. Derrubarei os meus celeiros e construirei outros maiores. Neles recolherei tudo o que tenho e todos os meus frutos. E então poderei dizer a minha alma: tens muitos bens em depósito para muitos anos, ó alma minha! Descansa, come, bebe, regala-te! - mas Deus disse a esse pobre homem rico: - néscio! Esta noite te virão demandar a tua alma, e os frutos da terra que amontoaste e todos os teus bens para quem serão? - assim é o que entesoura para si mesmo e não é rico para com Deus.

Os entesouradores pessoais organizam-se em associações, em trustes, em gigantescos monopólios. Pegam os frutos das árvores, os frutos minerais das entranhas da terra, os frutos aquáticos dos rios e dos mares, sugam os lençóis subterrâneos e as misteriosas jazidas que os séculos formaram, e de tudo isso fazem moedas ingênuas, doiradas ou prateadas, cintilantes de pureza, que transformam em instrumentos de suplício e de vício.

Os entesouradores pessoais se associam contra os pobres, dominam nações e povos, exploram multidões e se consideram benfeitores da Humanidade. Graças ao poder do dinheiro acumulado, o ingênuo e puro dinheiro que leva saúde ao doente e alimento ao faminto, mas que em suas mãos se transforma em lâminas do punhal assassino, derrubam governos, subvertem regimes, tripudiam sobre o direito das Gentes. Mas um dia alguém vem demandar-lhes a Alma néscia e apagar-lhes das gerações a odiosa memória, o exemplo corruptor.

Salomão vestiu-se de púrpura e ouro, mas apenas os cânticos que lhe atribuíram, pois nem isso era dele, conservaram sua memória entre os homens. E o Jovem Carpinteiro lembrou que as flores do campo se vestiam com maior riqueza e maior esplendor do que o Rei cantor. Os homens se inquietam pelo vestir e pelo comer, querem garantir o futuro com as escoras inúteis dos bens materiais. Mas o futuro do homem não está na matéria e sim no Espírito, porque o homem é espírito, é uma chama e não o corpo de lama, a vasilha frágil de argila em que a chama crepita. O futuro do Homem é o Reino. Ai dele quando não pode entrar pela porta estreita.

Por isso, o Jovem Carpinteiro ensinou:

- Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua Justiça, E tudo o mais vos será dado por acréscimo. Não temais, ó inquieto rebanho, pois foi do agrado do vosso pai dar-vos o seu reino. vendei o que possuis e dai-o aos pobres; provei-vos de bolsas de estrelas, que não se gastam com o tempo nem se consomem na morte; ajuntai o tesouro das coisas do céu, que não estão sujeitas ao ladrão, nem a ferrugem ou ás traças. Porque onde está o vosso tesouro, ali estará também vosso coração!

O mensageiro do Reino me disse, a respeito destas palavras:

- que fazeis ao ajuntar frutos e pedras da Terra? Quando a chama rompe a vasilha de barro, vossa Alma se evapora titubeante e incerta. Conheceis o fogo fátuo? Não sereis mais do que isso. Mas tereis a dolorosa consciência da vossa fragilidade, da vossa insegurança e da vossa inutilidade. Néscios! Os frutos e as pedras da Terra devem servir aos vossos corpos na medida do necessário, pois podeis convertê-los em Estrelas e Sóis pela magia do Espírito. Não existe mais bela alquimia. Sede os alquimistas da caridade!

Pensei nessas frases e disse a mim mesmo:

- Deus pôs as árvores na Terra carregadas de frutos materiais, mas sobre nossas cabeças estendeu também a fronde do Céu, carregada de frutos de luz. Por que havemos de preferir, para o nosso tesouro, os frutos efêmeros, em vez de guardar os que são eternos? Quando colho os frutos de uma árvore e os converto em moedas, cobrando ao faminto o preço exorbitante que deve me garantir o lucro, devolvo a pureza da polpa e o mistério das sementes à rigidez do metal. Mas quando tomo esses frutos e sacio com eles a fome das crianças pobres, transformo a polpa e as sementes em luz para o Reino de Deus.

O Jardim do Éden é o Jardim do Reino. A serpente que nele penetrou para tentar Eva estava aninhada no coração de Adão. A serpente, por si mesma, jamais poderia entrar lá. Mas como Deus concedeu a Adão o direito à liberdade, foi através dele que ela invadiu o Éden. Antes de comer a maçã, Adão e Eva já estavam condenados. A tentação não vem de fora, mas do próprio coração do homem. A alegoria Bíblica do Éden é a primeira referência das Escrituras ao mistério do Reino.

Mas ela mesma foi transformada, essa simples e encantadora referência, em motivo de ganância e exploração para os homens. Entretanto, como era de origem Divina, os homens não conseguiram corrompê-la. O Apóstolo Paulo lembraria mais tarde: - Se por um homem, Adão, fomos perdidos, também por um homem, o novo Adão, o Cristo, fomos salvos.

O mensageiro do Reino me explicou:

- A alegoria da perdição conduz a alegoria da salvação. O homem cometeu o pecado da desobediência ao comer a maçã da sabedoria, ao adquirir a Razão. Porque então se definiu como um Ego, como um Ser, e julgou-se semelhante a Deus. Nas fases primitivas da sua existência ele vagava no Éden, livre e puro dirigido pelos instintos como os demais seres. Depois que começou a raciocinar acreditou-se dono das coisas e dos seres. Quis possuir, entesourar, engrandecer-se aos próprios olhos e aos olhos dos outros. Foi então que fugiu de Deus e criou seu próprio mundo. Mas Deus o deixou em liberdade, amadurecendo na experiência e na dor. E por fim mandou-lhe o Jovem Carpinteiro para construir-lhe, com as taboas e os troncos das árvores, sempre generosas, a Tenda da Reconciliação.

Entendei as coisas em Espírito e Verdade e não vos enredeis no cipoal das letras.
Entremos na Tenda da Reconciliação, procurando de novo o Amor e a Justiça de Deus, e em breve estaremos de novo no Jardim do Éden. Passaremos alegres e leves pela porta estreita, que se abre como pequena brecha no grande Portal do Reino.

Façamos dos frutos da Terra o tesouro da nossa caridade permanente. Não entesouremos nada em prejuízo dos outros. Não roubemos. Sejamos capazes de imitar as árvores: De ramos abertos no Céu e sombra estendida na Terra.

O Reino começa em nosso coração.
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Obs.: Espero que este pequeno trecho estimule a leitura das 40 páginas desta obra:
http://www.oconsolador.com.br/linkfixo/bibliotecavirtual/diversosautores/OReino.pdf


Mais informações sobre este jornalista, filósofo, educador, parapsicólogo, escritor e tradutor brasileiro:



MESA: Homenagem ao Cem Anos de J. Herculano Pires


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